quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

ENTRUDO

(A. J. C., fl. ca 1840- http://purl.pt/4892)

Sala vulgar dum cabaré.
Antemanhã. Findou o entrudo.
Calou-se a voz do oboé.
Um par ainda: eu ao pé
da columbina de veludo.
 

Envergo um fato de palhaço
com lantejoulas corroídas;
largo de mais, o corpo lasso
joga mal nele; em cada braço
tombam as mangas desmedidas.


Dela afinal nada conheço.
(Meu coração, no entanto, a escuta...)
A sua mascarilha é um muro espesso.
Nada lhe dou, nada lhe peço...
Será donzela?... Prostituta?


Uma luz ácida, azulada,
Espreita já pela janela.
Saio. Que baça a madrugada!
Que alheia a rua abandonada!
Que vazio na alma que enregela!

 

Autor: Saúl Dias (1902-1983)

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