segunda-feira, 2 de novembro de 2015

"O homem das castanhas é eterno"

Na Praça da Figueira, ou no Jardim da Estrela, 
num fogareiro aceso é que ele arde. 
Ao canto do Outono, à esquina do Inverno,
 o homem das castanhas é eterno. 

Não tem eira nem beira, nem guarida, 
e apregoa como um desafio. 
 É um cartucho pardo a sua vida, e, 
se não mata a fome, mata o frio. 

Um carro que se empurra, um chapéu esburacado, 
no peito uma castanha que não arde. 
Tem a chuva nos olhos e tem o ar cansado 
o homem que apregoa ao fim da tarde. 

Ao pé dum candeeiro acaba o dia,
 voz rouca com o travo da pobreza.
 Apregoa pedaços de alegria, 
e à noite vai dormir com a tristeza.

 Quem quer quentes e boas, quentinhas? 
A estalarem cinzentas, na brasa. 
Quem quer quentes e boas, quentinhas? 
Quem compra leva mais calor p'ra casa.

 A mágoa que transporta a miséria ambulante, 
passeia na cidade o dia inteiro. 
É como se empurrasse o Outono diante;
 é como se empurrasse o nevoeiro.

 Quem sabe a desventura do seu fado?
 Quem olha para o homem das castanhas?
 Nunca ninguém pensou que ali ao lado 
ardem no fogareiro dores tamanhas. 

 Quem quer quentes e boas, quentinhas? 
A estalarem cinzentas, na brasa. 
Quem quer quentes e boas, quentinhas?
 Quem compra leva mais amor p'ra casa.

Sem comentários:

Enviar um comentário